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“e-Saúde Mental no SUS”: novo projeto do CISM é selecionado para execução em programa de inovação do Ministério de Saúde

“e-Saúde Mental no SUS”: novo projeto do CISM é selecionado para execução em programa de inovação do Ministério de Saúde 1280 853 INPD Cism

O projeto envolve uma plataforma tecnológica integrada, que usa Inteligência Artificial, para o diagnóstico e tratamento de transtornos mentais na Atenção Primária

O Centro de Pesquisa e Inovação em Saúde Mental (CISM) anuncia o desenvolvimento de um novo projeto: o “e-Saúde Mental no SUS”, uma plataforma com aplicativo de celular e Inteligência Artificial (IA) para o diagnóstico e tratamento de transtornos mentais na Atenção Primária. A intervenção concorreu com outras propostas tecnológicas de saúde digital e ficou entre as selecionadas pelo Programa de Desenvolvimento e Inovação Local (PDIL), do Ministério da Saúde. Será investido um recurso de quase 12 milhões de reais.

O projeto foi apresentado pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP) e concebido pelo CISM, que também coordenará sua execução. O “e-Saúde Mental” integrará o Módulo III, focado na ciência da implementação a partir do desenvolvimento de intervenções e transferência de tecnologia à sociedade. O responsável será o Professor Paulo Rossi Menezes, diretor científico do CISM.  

A ferramenta reunirá um conjunto de soluções para o diagnóstico, suporte ao tratamento e monitoramento da saúde mental dos pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS). As intervenções serão baseadas em evidências científicas, com efetividade comprovada por rigorosos ensaios clínicos randomizados. A plataforma visará também melhorar o conhecimento da população sobre saúde mental e reduzir o estigma, contribuindo para a adesão aos cuidados nesta área.

O “e-Saúde Mental” é inovador por integrar, em uma única plataforma, três níveis de acesso: paciente, profissional da Atenção Primária e gestores do SUS. Compatível com os sistemas Android e iOS, a plataforma será desenvolvida em parceria com o Instituto de Pesquisas Eldorado, que possui estrutura produtiva focada em inovação tecnológica, incluindo produtos digitais, criação de softwares e serviços relacionados.

Alta demanda de saúde mental 

Em países de baixa e média renda, como o Brasil, apenas 10% a 25% dos pacientes recebem tratamento adequado para sua demanda de saúde mental. Diante desta realidade, avanços tecnológicos recentes, como a telemedicina e o surgimento da Inteligência Artificial, têm transformado os métodos de diagnóstico, monitoramento e tratamento das doenças ao redor do mundo. O “e-Saúde Mental” foi pensado dentro deste cenário.

“A inovação digital na medicina e nos cuidados em saúde mental tem demonstrado que a tecnologia pode trazer maior acurácia diagnóstica, ampliação do acesso ao cuidado, expansão de territórios atendidos e maior custo-efetividade em serviços de saúde, sem perder o rigor técnico baseado em ciência”, comenta o Professor Paulo.  

Segundo ele, o Brasil é um dos países com maiores prevalências de ansiedade e depressão no mundo. De acordo com dados da Pesquisa Nacional de Saúde de 2019, quase 12% da população adulta brasileira sofre com sintomas de depressão, porém somente um em cada quatro recebe algum tipo de atenção em saúde mental. Essa desigualdade entre demanda crescente e a capacidade de atendimento do sistema público constitui um enorme desafio, que pode ser amenizado por inovações tecnológicas como o “e-Saúde Mental”.

O responsável pelo projeto será o Professor Paulo Rossi Menezes, diretor científico do CISM (Foto: Divulgação/CISM)

Inovação: como funcionará a plataforma 

Ao entrarem no app, os usuários realizarão um “Check-in Digital”, que permitirá o cadastro e o acesso ao protocolo de tratamento. Outra funcionalidade é a “Avaliação de Sintomas”, realizada a partir de questionários digitais, cientificamente validados, para a identificação de casos de insônia, ansiedade, depressão, entre outros, tendo os resultados integrados ao prontuário eletrônico do paciente. Existe, ainda, a função de “Identificação de risco”, na qual o sistema percebe situações deste tipo e emite alertas às equipes de saúde.

O “e-Saúde Mental no SUS” oferecerá aos usuários psicoeducação sobre transtornos mentais e técnicas autoaplicáveis de regulação emocional e ativação comportamental para a melhora dos sintomas. Baseada em Inteligência Artificial, a ferramenta será capaz de simplificar e otimizar o acerto do diagnóstico pelos profissionais, levando a um aumento das taxas de identificação precoce. Com isso, reduzirá o tempo entre a apresentação dos sintomas, o diagnóstico e o início do tratamento.  

Ainda com uso da IA, a ferramenta terá algoritmos para orientar o profissional da Atenção Primária sobre o resultado das avaliações às quais os usuários serão submetidos, o diagnóstico provável e as condutas indicadas de acordo com o caso, que poderão ser desde terapias farmacológicas ou não até a necessidade de encaminhamento para serviços especializados. O app avalia também o avanço clínico do paciente ao longo do tempo. 

“Por ser alimentada por algoritmos de Inteligência Artificial, e monitorar sintomas ao longo do tempo, essa ferramenta tem a capacidade de aprender quais intervenções, medicamentosas ou não, são mais adequadas e eficazes para cada perfil de paciente, trazendo uma inovação importante no campo de medicina personalizada para o tratamento de saúde mental no Sistema Único de Saúde”, destaca o professor e psiquiatra Dr. Paulo.

A plataforma será desenvolvida nos Laboratórios de Investigação Médica (LIM-3 e LIM-39), do HC-FMUSP, do qual o Professor Paulo é responsável suplente (Foto: Divulgação/CISM)

Já em relação ao nível da gestão pública, o  “e-Saúde Mental no SUS” permitirá que as informações reunidas sejam disponibilizadas para a identificação de padrões, tendências e particularidades sobre saúde mental em diferentes regiões do país.  

“A ferramenta será capaz de gerar relatórios com indicadores de saúde mental para otimizar as decisões de gestão em saúde mental”, ressalta o responsável pelo projeto. “Por exemplo, será possível prever que indivíduos de determinadas regiões ou nível de escolaridade respondem pior ou melhor a determinadas medicações ou intervenções não farmacológicas oferecidas pelo aplicativo. Isso traz um avanço significativo”, explica. 

Dashboards com painéis interativos exibirão para os gestores públicos dados sobre o estado da saúde mental da população, a prevalência de transtornos em determinadas regiões, evolução dos casos ao longo do tempo, eficácia das intervenções, além da estimativa das necessidades de saúde mental dos estados a partir do histórico de pacientes, evasão, reincidência e encaminhamentos à Atenção Especializada, o que auxilia na elaboração de políticas públicas e condução de estudos científicos populacionais. 

Impacto no sistema público de saúde 

A partir de todas essas inovações, espera-se que a plataforma permita melhorar significativamente a taxa de resolutividade dos casos de saúde mental na Atenção Primária. Outros benefícios que o Professor Paulo aponta incluem a descentralização do cuidado em saúde mental, a redução da fila de pacientes que aguardam atendimento por especialistas, além da diminuição do custo para o sistema com atendimentos de alta complexidade, emergências e internações psiquiátricas. 

Segundo o professor, ao aderirem ao aplicativo, os pacientes passarão menos tempo adoecidos e, com isso, haverá uma redução dos encaminhamentos para os serviços de maior complexidade, os quais são mais custosos para o sistema tanto por sua estrutura física quanto pelos profissionais especializados que compõem esses níveis de atenção. 

“Teremos uma otimização das filas de espera por atendimento, já que a ferramenta irá auxiliar no reconhecimento de casos de maior gravidade e na organização de prioridades, tornando mais assertivos os encaminhamentos aos serviços de maior complexidade”, comenta o Professor Paulo. “É importante destacar também a redução da sobrecarga laboral, já que, por  estarem mais capacitados e com tempo otimizado, os profissionais de saúde terão menor tendência a sentirem-se inseguros ou sobrecarregados”.  

Em três diferentes cenários de tempo – curto, médio e longo prazo -, que vão da implementação parcial do app (2 a 4 anos), expansão nacional (4 a 6) até a total integração da ferramenta ao SUS em todas as áreas do Brasil, incluindo as mais remotas (6 a 10), estima-se que o “e-Saúde Mental” possa gerar uma economia em torno de 70% nos custos de saúde relacionados a transtornos mentais, devido à redução dos encaminhamentos e internações e à melhora da produtividade e da qualidade de vida da população. 

Impacto social 

A criação e implementação do “e-Saúde Mental no SUS” terá um grande potencial de ampliar e qualificar o acesso a cuidados em saúde mental da população, reduzindo desigualdades regionais. A tecnologia, de uso simples e acessível gratuitamente, aumentará a cobertura da oferta de tratamento ao disponibilizar recursos remotos a pacientes em áreas carentes ou afastadas dos centros, alcançando populações vulneráveis.  

“Tendo em vista que o ‘e-Saúde Mental’ aumentará as taxas de diagnóstico precoce,  possibilitando a adoção de tratamentos efetivos mais rapidamente, reduziremos o tempo em que a população vive com transtornos mentais e incapacidade. Isso melhora a qualidade de vida, permite que as pessoas retomem o quanto antes suas atividades cotidianas e gera grande impacto social e econômico’’, afirma o Dr. Paulo. 

A nova plataforma levará cerca de 1 ano e meio para ser desenvolvida. O conhecimento da tecnologia será transferido aos profissionais do SUS através da capacitação para a utilização da ferramenta de forma eficaz e autônoma. Isso será feito por meio de cursos de treinamento, manuais de operação e suporte técnico contínuo.

O Programa de Desenvolvimento e Inovação Local (PDIL)

O anúncio dos projetos selecionados foi feito pelo ministro da Saúde, Alexandre Padilha (Foto: Arquivo)

O Programa de Desenvolvimento e Inovação Local (PDIL), do Ministério da Saúde, une governo federal, setores da ciência, tecnologia e inovação e empresas públicas e privadas da indústria da saúde para estimular uma política de produção, desenvolvimento e inovação voltada à produção de medicamentos, soros, vacinas, dispositivos médicos, além de serviços de saúde e tecnologia digital de informação e conectividade. 

O objetivo do programa, segundo apresenta o Governo Federal, é promover o desenvolvimento da produção e inovação locais relacionados aos desafios em saúde, a sustentabilidade e resiliência do SUS e a ampliação do acesso à saúde, a fim de reduzir a vulnerabilidade produtiva e tecnológica do sistema. A intenção é ampliar o acesso universal a produtos e tecnologias na área e reduzir a dependência brasileira de importação.

No dia 29 de maio, o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, assinou a portaria que aprovou 22 projetos de inovação, entre eles o “e-Saúde Mental no SUS”. O investimento total se aproxima dos R$ 378 milhões. Das 22, oito iniciativas são de saúde digital, entre elas o novo projeto do CISM, e vão contribuir para a modernização do SUS, permitindo que a rede pública chegue a lugares mais remotos, assistindo populações mais vulneráveis.

5 de junho de 2025

Mainary Nascimento, Institucional CISM