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Demografia médica: Brasil tem 6,69 psiquiatras por 100 mil habitantes, a terceira menor taxa entre 41 países da OCDE

Demografia médica: Brasil tem 6,69 psiquiatras por 100 mil habitantes, a terceira menor taxa entre 41 países da OCDE 1234 820 INPD Cism

Apenas Colômbia e México ficam atrás do Brasil no ranking que compara dados de nações integrantes da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE)

O atlas “Demografia Médica no Brasil 2025 (DMB)”, organizado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), em parceria com a Associação Médica Brasileira (AMB), traçou o perfil da população de médicos psiquiatras, seus locais de atuação e a realidade epidemiológica e demográfica da especialidade no país. Lançado em 30 de abril, o material revela uma escassez de profissionais e desigualdades regionais.  

Segundo o estudo, que já é conduzido há 15 anos, o Brasil apresenta um dos menores contingentes de psiquiatras do mundo. Com um índice de 6,69 especialistas por 100.000 habitantes, o país responde pela 3ª menor taxa entre os 41 países avaliados pelo atlas. Apesar de superar outras nações da América Latina, como México (1,00) e Colômbia (2,00), o Brasil fica atrás do Chile (13,00) e abaixo da taxa média dos 41 países: 17,83. 

O ranking é liderado pela Suíça, com taxa de 53,00, seguida por Alemanha (28,00) e Grécia (26,00). Outras nações desenvolvidas também têm índices abaixo da média, como o Brasil: Estados Unidos (15,00), Portugal (15,00), Espanha (13,00) e Japão (13,00). 

“Esses dados evidenciam não apenas uma carência quantitativa de psiquiatras no Brasil, mas também reforçam a necessidade urgente de políticas públicas voltadas à formação e fixação de especialistas em saúde mental, sobretudo em regiões vulneráveis. A comparação com países da OCDE ilustra o tamanho do desafio nacional”, ressalta o psiquiatra e professor Euripedes Constantino Miguel, chefe do Departamento de Psiquiatria da FMUSP e coordenador do Centro de Pesquisa e Inovação em Saúde Mental (CISM).

O Professor Euripedes lembra de um estudo epidemiológico multicêntrico, conduzido pelo Instituto Nacional de Psiquiatria do Desenvolvimento (INPD), com participação de pesquisadores que hoje atuam no CISM, como Jair de Jesus Mari e Luis Augusto Rohde, além de outros, como Cristiane S. Paula, que avaliou crianças e adolescentes de 6 a 16 anos em quatro cidades brasileiras, representando diferentes regiões do país. 

Segundo o professor, os resultados deste estudo indicaram que aproximadamente 13,1% dos participantes apresentavam pelo menos um transtorno psiquiátrico. “Além disso, observou-se que uma parcela significativa desses jovens não recebia atendimento especializado adequado, evidenciando lacunas no acesso a serviços de saúde mental infantil e juvenil”, exemplifica o coordenador do CISM sobre os desafios nesta área. 

Raio-x da Psiquiatria no Brasil 

Além de ser baixo o contingente de psiquiatras, a distribuição desses profissionais é bastante desigual no Brasil. Do total de 13.581 especialistas, quase 3/4 (74,6%) estão nas regiões Sudeste e Sul – 51,8% e 22,8%, respectivamente. O Nordeste concentra 14,7% dos médicos psiquiatras, o Centro-Oeste 8,3% e o Norte possui o menor efetivo: apenas 2,4%.

“A concentração de especialistas nas regiões Sul e Sudeste aprofunda as desigualdades de acesso à saúde mental”, enfatiza o Professor Euripedes. “Esse cenário impõe barreiras estruturais ao cuidado, especialmente em populações do Norte e Centro-Oeste, e deve ser um foco prioritário de políticas de interiorização da residência médica e incentivo à fixação de profissionais no SUS destas regiões”, destaca.  

A Psiquiatria responde por uma fatia de 2,8% do total de médicos especialistas no país. Apesar de baixa, a quantidade ocupa a 12ª colocação entre as 55 especialidades listadas, ficando à frente, por exemplo, da dermatologia (2,4%) e da neurologia (1,2%). A classificação é liderada pela clínica médica (12,4%), pediatria (10%) e cirurgia geral (7,8%). 

Embora não esteja entre as especialidades que mais cresceram nos últimos anos, a Psiquiatria teve um aumento importante de 113%, com 7.204 especialistas a mais nos últimos 13 anos. Em 2011, havia 6.377 médicos psiquiatras espalhados pelo Brasil. Apenas 17 especialidades médicas cresceram menos do que a Psiquiatria neste período.   

Perfil do psiquiatra brasileiro 

Segundo traçou a Demografia Médica”, o típico especialista psiquiatra brasileiro é homem e tem, em média, 52,7 anos de idade. Do total de 13.581 especialistas, menos da metade é mulher: 47,2% (6.411). Além disso, apenas 15,6%, ou 2.123, têm 35 anos ou menos e 32,6%, ou 4.422, já chegaram aos 55 anos ou passaram desta faixa etária.

Fonte: “Demografia Médica no Brasil 2025”

O atlas 

“Demografia Médica no Brasil 2025” aborda não só a Psiquiatria, mas a Medicina em geral no país e suas 55 especialidades. O estudo contou com a cooperação técnica do Ministério da Saúde, da Organização Pan-Americana da Saúde, da Associação Médica Brasileira e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP)

O propósito, segundo seus organizadores, é o de gerar conhecimentos originais e disponibilizar informações relevantes para formuladores de políticas e gestores públicos. “Que as evidências aqui reunidas possam apoiar, de maneira concreta, os tomadores de decisão na construção de um sistema de saúde mais justo, eficiente e equitativo para todos os brasileiros”, afirma no documento Eloisa Silva Dutra de Oliveira Bonfá, da FMUSP.

Em relação a dados gerais da Medicina, o material mostra que o total de médicos no Brasil deve chegar a 635.706 ao final de 2025 – 2,98 profissionais a cada 1.000 habitantes. Apenas nos últimos cinco anos, o país ganhou 116.546 novos profissionais. 

Na última década, o número de médicos nos países membros da OCDE cresceu mais rápido do que a população em geral. Atualmente, o Brasil possui uma taxa de 2,98 médicos para cada grupo de 1.000 habitantes, acima de nações como Estados Unidos e Coreia do Sul, porém abaixo da média de integrantes da organização: 3,70 profissionais.

Clique AQUI para acessar a “Demografia Médica no Brasil 2025 (DMB)”.

O material é organizado pela FMUSP, em parceria com a Associação Médica Brasileira (AMB) (Foto: Reprodução)

Ensino e pesquisa 

O atlas ainda mostrou que, no conjunto de escolas médicas públicas e privadas, além de ensino, 11.203 docentes (27,7%) atuam em pesquisa. Entre eles, 14,4% possuem financiamento para o desenvolvimento dos projetos. Já 5.120 (12,6%) exercem função em pós-graduação, enquanto 15.041 (37,2%) realizam atividades de extensão. Além disso, segundo dados, cerca de um quarto dos docentes (23,6%) participa da gestão acadêmica.

O Centro de Pesquisa e Inovação em Saúde Mental (CISM) é dirigido por médicos psiquiatras, que são também vinculados às maiores universidades públicas do Brasil – referência na área da Psiquiatria – e que dedicam a carreira à pesquisa e ao ensino. 

A “Demografia Médica no Brasil 2025” também abordou dados sobre a formação continuada dos médicos. Em 2024, o Brasil registrou 112 cursos de pós-graduação lato sensu em Psiquiatria. A especialidade é a terceira com mais oferta de cursos, perdendo apenas para Endocrinologia e Metabologia, em primeiro lugar, e Dermatologia, em segundo. 

Os gestores do CISM incentivam o desenvolvimento de futuros talentos na área da pesquisa em Psiquiatria. Além das tradicionais modalidades de estudo de Iniciação Científica (IC) e de pós-graduação, o CISM ainda oferece o Programa Internacional Tripartite Especial de Pós-Graduação em Neurociência Translacional do Desenvolvimento.

Euripedes Constantino Miguel é chefe do Departamento de Psiquiatria da FMUSP e coordenador do CISM (Foto: Divulgação/CISM)

Para o coordenador do CISM, apesar de não liderar o crescimento entre as especialidades, o atlas mostra que a Psiquiatria teve uma expansão significativa, o que, na opinião dele, sinaliza um interesse crescente na área, possivelmente impulsionado pelo aumento do reconhecimento e da demanda por cuidados em saúde mental da população. 

De acordo com o Professor Euripedes, esse movimento pode estar também relacionado aos avanços no conhecimento científico da área, que vêm permitindo intervenções cada vez mais eficazes. Além disso, de forma mais conjectural, acredita que aspectos práticos da atuação profissional também tenham contribuído para essa escolha.

“Como a possibilidade de trabalho em consultório privado, uma vez que, diferentemente de outras especialidades, a Psiquiatria ainda mantém espaços de atuação não inteiramente regulados por convênios e operadoras de saúde, o que pode representar maior autonomia clínica e retorno financeiro mais direto”, explica o psiquiatra. 

Apesar dessas considerações, o Professor Euripedes alerta que, para que esse crescimento traga impacto real na atenção à saúde mental da população, “ele precisa ser qualificado e distribuído de forma mais equitativa entre as regiões do país”.

28 de maio de 2025

Mainary Nascimento, com apoio de Rian Esdras, Institucional CISM