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Coorte brasileira sobre neurodesenvolvimento já pautou tese de conclusão de curso de Harvard condecorada com Magna Cum Laude

Coorte brasileira sobre neurodesenvolvimento já pautou tese de conclusão de curso de Harvard condecorada com Magna Cum Laude 2022 1081 INPD Cism

Dados de neuroimagem coletados pela Brazilian High Risk Cohort (BHRC), um dos maiores estudos do mundo sobre a formação do cérebro, foram usados por aluna americana em pesquisa sobre trauma infantil e autolesão não suicida 

A pesquisa e os pesquisadores brasileiros cumprem importantes papéis para o avanço da ciência na área da saúde mental no mundo. É do Brasil um dos mais importantes estudos científicos sobre o desenvolvimento do cérebro: a Brazilian High Risk Cohort (BHRC) Coorte Brasileira de Alto Risco para Transtornos Mentais. O estudo, que conta com um banco de dados com centenas de milhares de variáveis científicas, alimentado há 15 anos, possibilita que inúmeras pesquisas sejam feitas, mundo afora, sobre as origens dos transtornos mentais.  

Frequentemente, pesquisadores brasileiros e estrangeiros, vinculados a diferentes instituições de ensino, apresentam trabalhos com dados da BHRC e conquistam prêmios em reconhecimento à qualidade da pesquisa. Este foi o recente caso da psicóloga Sarah Borges, formada em Harvard, que acessou informações da Coorte para um estudo sobre jovens e estigmas em saúde mental e obteve o “Sophia Freund Prize” – inédito para um brasileiro.   

Mas você sabia que este não é o único episódio de destaque internacional relacionado a trabalhos pautados pela BHRC? Ainda em 2023, a britânica Evie Coxon, então graduanda da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, utilizou dados de neuroimagem coletados em participantes da Coorte brasileira. O resultado? Com a tese, Evie obteve a importante honraria acadêmica Magna Cum Laude, concedida a alunos com desempenho excepcional.   

Intitulada Examining Frontolimbic Connectivity and Childhood Trauma as Predictors of Non-Suicidal Self Injury in a High-Risk Cohort of Children – “Analisando a conectividade fronto-límbica e o trauma infantil como preditores de autolesão não suicida em uma coorte de crianças de alto risco” (em livre tradução para o português), a pesquisa de Evie fez achados que sugerem que a conectividade reduzida em uma parte do cérebro pode estar associada ao desenvolvimento de autolesão não suicida em crianças com alto risco de psicopatologia.

A pesquisa científica da então aluna do Harvard College em Neurociência contou com a análise de 100 ressonâncias magnéticas funcionais dos participantes da Coorte. A BHRC acompanha 2.500 jovens nas cidades de São Paulo (SP) e Porto Alegre (RS) em uma investigação sobre as origens neurobiológicas e ambientais dos transtornos. O longo estudo é ligado ao Centro de Pesquisa e Inovação em Saúde Mental (CISM), onde recebe o nome de “Conexão Mentes do Futuro”. 

Para acessar os dados da Coorte, Evie contou com o apoio de pesquisadores brasileiros ligados ao projeto: os psiquiatras Marcelo Brañas e Marcos Croci, que, hoje, além de atuarem no CISM, também coordenam o Ambulatório para o Desenvolvimento dos Relacionamentos e das Emoções (ADRE), do Instituto de Psiquiatria (IPq), do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP). 

Para Brañas, tamanho reconhecimento demonstra a potência de pesquisas baseadas na ciência brasileira. “Através de projetos como este, o Brasil hoje consegue contribuir de maneira significativa para o avanço da ciência em neurodesenvolvimento em suas diversas frentes. Desde a coleta de dados de neuroimagem, genética e psicométricos até sua análise e produção final de conteúdo para publicação, pesquisadores brasileiros vêm assumindo papéis cada vez mais importantes no meio científico”, destaca o pesquisador do CISM. 

A orientadora da graduanda foi a Drª Jenna Traynor, em um projeto do laboratório da Drª Lois Choi-Kain. Nos agradecimentos da tese, além de Marcelo e Marcos, Evie ainda nomeou outros pesquisadores que colaboraram para o sucesso do trabalho, como os brasileiros Dr. André Zugman (neuroimagem) e Dr. André Rafael Simioni (data manager) – ambos também integrantes do CISM e da BHRC. 

Atualmente, Evie faz doutorado na Max Planck School of Cognition, em Berlim, na Alemanha

A tese

A aluna avaliou 100 exames de neuroimagem de participantes da Coorte brasileira (Imagem de Wolfgang Eckert/Pixabay)

O estudo que rendeu a Evie Coxon o grau de bacharela em Neurociência em Harvard examinou se alterações na conectividade funcional em repouso na região cerebral chamada “fronto-límbica” estão associadas ao desenvolvimento da autolesão suicida. Esta área do cérebro refere-se à rede de conexões e interações entre o córtex pré-frontal (parte do lobo frontal, localizado na região anterior do cérebro) e o sistema límbico (emoções, memória). 

A pesquisa investigou, ainda, se o trauma infantil tem algum efeito perceptível nesta conectividade em pessoas com autolesão suicida. Os achados indicaram conectividade funcional reduzida entre os córtex orbitofrontais esquerdo e direito em indivíduos com autolesão. Localizada acima das órbitas oculares, esta região é fundamental para a tomada de decisão, processamento de recompensas e punições, controle de impulsos e comportamento social.

17 de novembro de 2025 

Mainary Nascimento, Institucional CISM