Os pesquisadores vão comparar os resultados de três abordagens diferentes que usam ou não o fármaco escetamina nos atendimentos de urgência
O Centro de Pesquisa e Inovação em Saúde Mental (CISM) dará início a um novo projeto de impacto na saúde pública: o “SAVE Study”. O estudo visa avaliar a eficiência de diferentes abordagens para a prevenção de pensamentos e comportamentos suicidas em pacientes de alto risco nas unidades de emergência do município de Indaiatuba, no interior de São Paulo. A previsão é que o estudo comece nos próximos meses.
Os pesquisadores realizarão um ensaio clínico randomizado e controlado, de fase 4, para avaliar e comparar os resultados de três diferentes intervenções. Uma delas fará uso da escetamina, um anestésico que tem mostrado resultados rápidos na redução da ideação suicida, oferecendo alívio imediato para pacientes passando por uma crise aguda. Será oferecida uma infusão única do medicamento (0,5 mg de escetamina para cada quilo de peso do paciente) durante 40 minutos, em combinação com o tratamento usual aprimorado – seguimento na rede de saúde municipal, com maior apoio para aumentar a adesão ao tratamento).
A outra abordagem será focada no “Plano de Resposta à Crise (PRC)”, uma intervenção não-farmacológica de segurança psicológica baseada em evidências. O plano, que também será disponibilizado em combinação com o tratamento usual aprimorado, inclui estratégias para reconhecer sinais de alerta, utilizar mecanismos de enfrentamento internos e externos, além de como acessar apoio profissional, reduzindo o risco de tentativas.
A terceira e última abordagem avaliará os resultados em pessoas que receberão apenas o tratamento usual. O objetivo é comparar os efeitos da escetamina e do Plano de Resposta à Crise na redução da ideação e dos comportamentos suicidas em pacientes de alto risco, fornecendo evidências para intervenções acessíveis e econômicas que possam ser implementadas na saúde pública e ajudem a aliviar, com maior efetividade, o sofrimento desses pacientes.
O psiquiatra especialista em prevenção do suicídio Dr. Rodolfo Furlan Damiano, gestor e coordenador do estudo, conta que esta será a primeira comparação direta em larga escala e no mundo real entre intervenções farmacológicas de ação rápida e intervenções psicológicas baseadas em evidências (PCR) para a prevenção do suicídio em um sistema de saúde pública – formas simples e baratas capazes de serem aplicadas em larga escala
“Os resultados fornecerão evidências cruciais para diretrizes de prática clínica e subsidiarão a implementação dessas intervenções no Brasil e em contextos globais semelhantes”, conta o pesquisador do CISM. “O desenho pragmático garante que os resultados sejam diretamente aplicáveis à prática de rotina do departamento de emergência de unidades públicas de saúde, enquanto a análise abrangente de biomarcadores pode identificar preditores biológicos da resposta ao tratamento para personalizar as abordagens de prevenção”.
O Professor Euripedes Constantino Miguel, professor titular e chefe do Departamento de Psiquiatria da USP, coordenador do CISM e responsável pelo estudo, ressalta que o suicídio é um problema complexo que exige soluções múltiplas. “Este estudo busca oferecer respostas práticas para o SUS, testando intervenções que podem ser implementadas de forma imediata e realista, salvando vidas e reduzindo sofrimento”, afirma.
O suicídio é um grande desafio para a saúde pública, com mais de 800 mil mortes em todo o mundo. O Brasil registrou um aumento de 57% nas taxas entre os anos 2000 e 2019, destacando a necessidade urgente de estratégias eficazes de prevenção.
Como funcionará o SAVE Study
O projeto é voltado a pacientes não-hospitalizados suicidas de alto risco, que tenham a partir de 14 anos. Os pacientes atendidos em qualquer Pronto Socorro de Indaiatuba que se encaixarem nos critérios poderão participar. O grau de risco será definido por tentativas recentes e pela Escala de Gravidade do Suicídio de Columbia. O projeto poderá ser expandido em breve para outras cidades, como o município de Jaguariúna, onde o CISM também possui relação de parceria.
A meta é que 450 pessoas façam parte do estudo, divididas em cada um dos três grupos de abordagem. Todas serão acompanhadas pela equipe do projeto pelo período de 1 ano.
Os pesquisadores vão avaliar o impacto das modalidades de tratamento na saúde mental geral. Serão considerados o tempo até uma nova crise suicida, diferenças de resposta ao tratamento com base em fatores demográficos, qualidade de vida relacionada pelo paciente e resultados funcionais, efeitos adversos ou complicações, custo-efetividade e marcadores psicopatológicos, biológicos e socioeconômicos de resposta ao tratamento. Também serão analisadas alterações no quadro de gravidade da depressão e ansiedade, bem como a satisfação do paciente e do médico com os tipos de intervenções oferecidas.
Não poderão participar pessoas com contraindicações maiores para a terapia com escetamina, transtornos psicóticos e graves por uso de substâncias, em gravidez ou lactação, ou com incapacidade de consentir. O protocolo de infusão inclui monitoramento contínuo e avaliação de segurança, enquanto o PRC será administrado por psicólogos clínicos experientes, com treinamento e supervisão para garantir a fidelidade do tratamento.
Gerenciado pelo CISM, o projeto será conduzido em parceria com as secretarias municipais de saúde dos municípios e contará com a participação de professores e alunos do Centro Universitário Max Planck (UniMAX) e do Centro Universitário de Jaguariúna (UniFAJ), ambas instituições parceiras do Centro de Pesquisa, que é ligado ao Instituto de Psiquiatria (IPq), da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).
O projeto teve aprovação do Comitê de Ética em pesquisa do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, e todos os participantes ou seus responsáveis (para menores de 18 anos) devem consentir e assinar um termo de consentimento antes da participação no estudo. Não haverá compensação financeira e os participantes terão apoio direto dos coordenadores do estudo para eventuais efeitos adversos que possam advir da participação.
7 de outubro de 2025
Institucional CISM